Opinião

Edição nº1425 – sexta-feira, 15 de janeiro de 2021

O palhaço e nós: os bobos

Rafael Borges

Consultor jurídico da AFBNDES, advogado criminalista.

Como tudo que Jair faz nesta vida, suas críticas ao sistema eleitoral eletrônico, impulsionadas pelos recentes acontecimentos no coração do Império, integram uma estratégia diversionista, desenhada sob medida e com algumas finalidades bastante pragmáticas: a) canalizar a atenção da mídia e da população em geral para um tema menor e desimportante, enquanto o Brasil segue quebrando recordes de mortos pela pandemia, muitos dos quais evitáveis e diretamente atribuíveis à inação do seu governo; b) reforçar o discurso de polarização e colocar Jair mais uma vez “contra tudo isso que está aí”, mesmo que o próprio e sua família sejam subprodutos óbvios das estruturas que tentam demonizar; e c) reduzir o processo democrático a pleitos eleitorais e à metodologia (se papel ou computador) empregada na captação da vontade popular, recurso que não é exclusivo de Jair, diga-se de passagem, posto que empregado por diversas forças políticas antes dele.  

Divertir a mídia, no sentido amplo do termo, é o que Jair faz de melhor. Cada declaração tresloucada é pauta para editoriais dos jornalões, que, por má-fé ou burrice mesmo (e a ignorância é vizinha da maldade, já diz um ditado árabe), dedicam reflexões extensas a toda sorte de estupidez, como se conversassem com um interlocutor intelectualmente honesto. Ficam Merval, Miriam e congêneres entretidos com as palhaçadas, e a Covid segue torando; parece até que disputa corrida com a ciência, agora que deve saber sobre a chegada das vacinas.  

A lógica de ringue e de autocolocação permanente num “beco sem saída” é recurso comum a derrotados, mas que funciona muito bem num ambiente dominado por teorias da conspiração e linguagem mimética. O meme que dispensa interpretações e o clima de perseguição são ferramentas utilíssimas na transmissão de “pensamentos” falsos, pós-verdadeiros e mal intencionados. Consolidam no imaginário popular a ideia de que a política é simplória, binária e que Jair só não governa porque não o deixam. Como se o seu “não governo” não fosse, em si mesmo, um projeto.  

Só quem nunca leu meio livro de história consegue equiparar, ainda que discursivamente, democracia à eleição. Nem a democracia liberal burguesa, vitoriosa no Ocidente, é tão reduzida assim. Jair não está nem aí para a democracia, seja de corte burguês, liberal ou socialista. Ele quer “causar” e “lacrar”, até que o Twitter também lhe casse o login. Seu desejo é divertir, entreter e conspirar, ao passo que impõe “democracia” como sinônimo de “eleições”, afastando cada vez mais o controle popular dos seus atos e permitindo que as estruturas de governo se convertam, sempre e sempre, em linhas auxiliares dos processos de acumulação de capital.  

Jair diverte para que Guedes tome e execute decisões. Os bobos somos nós.  

 

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