Ernani Teixeira Torres
Filho (*)
O
Banco Nacional do
Desenvolvimento
Econômico e Social (BNDES)
atravessa a pior crise
de sua história. Nos
dois últimos anos, a
rota de expansão que a
instituição seguiu desde
2008 foi revertida e deu
lugar a um processo
de rápido encolhimento,
que ameaça sua
sobrevivência em um
prazo relativamente
curto.
Uma parcela da retração
do crédito do BNDES é
de natureza
conjuntural e está
associada à forte queda
na demanda de crédito,
resultante da longa e
profunda recessão que se
abateu sobre a economia brasileira
a partir de 2015.
Entretanto, mesmo quando
a economia retomar, o
banco de desenvolvimento
continuará se retraindo
pela ação de fatores
estruturais
contracionistas que
continuarão atuando.
O mais importante deles
está relacionado às
mudanças em curso no
mercado de crédito de
longo prazo diante da
perspectiva de se
atravessar um período
prolongado de taxas
nominais de juros e de inflação historicamente
baixas, em níveis de
apenas um dígito ao ano.
Trata-se de um evento
benéfico para a economia
brasileira, mas que, por
reduzir a
competitividade dos
recursos administrados
pelo BNDES, já o obriga
a realizar um forte
ajustamento.
Entretanto, a capacidade
de resposta do BNDES a
esse cenário desafiante
está comprometida pela
atuação de três outros
fatores. Dois deles
decorrem da política econômica
adotada pelo governo
Temer. Nesse conjunto se
inclui a criação da Taxa
de Longo Prazo (TLP) que
seguirá automaticamente
a taxa de risco cobrada
pelo mercado para os
títulos do Tesouro de 5
anos, adicionada ao
Índice de Preços ao
Consumidor Amplo (IPCA).
A
TLP será
substancialmente mais
elevada que a antiga
Taxa de Juros de Longo
Prazo (TJLP) que era
determinada pelo
Conselho Monetário
Nacional, de acordo com
a política econômica do
governo. Com a TLP, o
custo do crédito do
BNDES será superior à
taxa básica de dos
bancos comerciais — a
Selic — e ao custo de
captação no mercado de
capitais das empresas de
bom risco de crédito.
A
essa medida, se soma
a rápida drenagem do
caixa livre do
BNDES pelo Tesouro
Nacional. Se toda a
demanda anunciada pelo
governo for atendida, o
BNDES terá até 2018,
devolvido cerca de R$
310 bilhões mais da
metade do estoque de
créditos do governo
federal na
instituição em 2016.
Esses pagamentos reduzem
sobremaneira o tamanho
do ativo de crédito do
BNDES e comprometem sua
liquidez no médio prazo.
Esses fundos foram
originalmente aplicados
a um prazo médio
superior a 7 anos,
enquanto as antecipações
reduzem o caixa da
instituição de imediato.
Isto compromete mais que
proporcionalmente a
geração própria de caixa
da instituição nos anos
seguintes.
Finalmente, o último
fator limitador é
de ordem reputacional. O
BNDES foi publicamente
envolvido nas ações
investigativas sobre o
financiamento ilegal de
políticos por grandes
empresas nacionais. Sua
atuação
desenvolvimentista foi,
nesse episódio, reduzida
a um mero instrumento de
subsídio a grandes
interesses econômicos e
vulgarmente comparada a
uma "meia entrada" de
cinema. Antigos
dirigentes e vários de
seus técnicos estão
sendo investigados pelos
órgãos de controle e da justiça até
o momento sem, até o
momento, nenhuma
comprovação de dolo.
A ação concertada desses
fatores levanta fortes
indagações sobre o
destino que o BNDES terá
nos próximos anos. Não
será a primeira vez que
perguntas dessa natureza
são feitas na história
da instituição.
Entretanto, nunca
ao longo de seus mais de
60 anos de existência, o
banco de desenvolvimento
enfrentou uma situação
de tão grande
fragilidade.
Em
compensação, existem
elementos
de robustez que ainda
estão preservados. A
qualidade dos ativos
financeiros do BNDES é
muito boa. Apesar de
todas as ilações
negativas que foram
feitas, o risco de suas
carteiras de empréstimos
e de ações continua
sendo muito inferior ao
do restante do sistema
bancário.
O
mesmo acontece com a
capacidade do corpo
técnico da instituição.
Existe um conhecimento
acumulado na gestão de
operações de
financiamento de longo
prazo e de participação
acionária que constituem
uma vantagem competitiva
da instituição. Esses
dois elementos não são
de fácil nem rápida constituição e
podem ser de relevância
estratégica para um
governo que veja valor
em dispor de um
instrumento próprio e já
consolidado para atuar
no mercado financeiro
com vistas à
operacionalização de
créditos de longo prazo
voltados para a retomada
da economia e do
desenvolvimento
nacional.
Diante desse cenário,
esse texto pretende
apresentar medidas para
mudar o marco
regulatório a que o
BNDES está submetido
para a evitar o processo
de sua desmontagem. Para
tanto, será apresentado
inicialmente de forma
sucinta a evolução do
crédito do BNDES desde
2003, tendo como pano de
fundo as transformações
ocorridas no mercado
financeiro nacional. Em
seguida, será analisado
o desempenho do BNDES e
do mercado de crédito
corporativo de longo
prazo, particularmente o
das debêntures. Segue-se
uma avaliação dos
fatores contracionistas
que estão colocando em
cheque o modelo
operacional da
instituição.
1. A evolução do
mercado de crédito de
2003 a 2017: da expansão
à crise
A
evolução recente do
crédito no Brasil pode
ser dividida em dois
períodos. No primeiro,
que se estendeu de 2003
a 2015, o mercado
brasileiro foi um dos
que mais se expandiu em
todo o mundo (Banco
Mundial, 2017). Esse
crescimento rápido fez
com que o país deixasse
para trás um cenário
historicamente
caracterizado por uma
oferta de crédito
restrita, volátil e
demasiado custosa
(Torres e Macahyba,
2012).
A
expansão do mercado de
crédito foi, até 2008,
liderada pelos bancos
privados nacionais. Esse
grupo de instituições
demonstrou maior agilidadepara
atender a um mercado
movido, em grande
medida, pela demanda das
famílias. Apoiados em
inovações como o crédito
consignado e a alienação
fiduciária para imóveis,
as instituições privadas
conseguiram ofertar com
mais rapidez novos
produtos financeiros
voltados para um mercado
que estava se abrindo,
enquanto as instituições
estatais se
reposicionaram mais
lentamente (Gráfico 1).
Esse cenário
foi comprometido pelo
choque gerado pela crise
financeira internacional
de 2008. Desde então,
os bancos privados se
retraíram ao mesmo tempo
em que as instituições
públicas deram início a
um forte processo de
expansão. Com isso,
entre dezembro de 2008 e
dezembro de 2015, o
estoque de crédito dos
bancos públicos passou
de 14,2% do PIB para
30%, enquanto o dos
nacionais privados
recuou de 17,0% para
15,8%.
Gráfico 1. Saldo
do Crédito ao Setor
Privado por Tipo de
Banco (Em % do PIB)

Fonte: Banco Central
do Brasil
Esse crescimento dos
bancos públicos esteve
diretamente associado ao
aumento das operações
com recursos
direcionados. Esses
empréstimos são
concentrados em duas
modalidades. A principal
delas é composta pelos
programas do BNDES,
voltados quase que
exclusivamente para
Pessoas Jurídicas (PJ).
O segundo grupo
importante são as
operações imobiliárias
realizadas pela Caixa
Econômica Federal
para as Pessoas Físicas
(PF). Suas principais
fontes de recursos são,
respectivamente, o Fundo
de Amparo ao Trabalhador
(FAT) e o Fundo de
Garantia por Tempo de
Serviço (FGTS).
A partir da crise de
2008, o Tesouro se somou
a esses Fundos, graças à
transferência de R$ 400
bilhões para o BNDES.
O longo período
expansivo do crédito foi
sucedido a partir do
início de 2016 por uma
forte contração. Entre
janeiro de 2016 e
outubro de 2017, o
estoque dos empréstimos
bancários recuou de
53,7% para 46,9%, uma
queda de 6,3 pontos
percentuais frente a um
PIB que, nesse
intervalo, recuou cerca
de 8%. Essa retração se
deu quase que
exclusivamente (97%) no
crédito às empresas e
dividiu-se em partes
iguais entre o segmento
livre e o direcionado. O
BNDES, isoladamente,
respondeu por 45% da
redução no crédito às
empresas nesse período.
2. O BNDES e as
transformações recentes
do crédito corporativo
de longo prazo
O
crédito corporativo
doméstico de longo prazo
no Brasil é formado
por quatro segmentos,
que se distinguem
conforme o originador do
empréstimo e a fonte do
financiamento. O maior
deles é formado
pelas operações diretas
do BNDES. Estes créditos
são gerados e mantidos
na carteira própria da
instituição e são, em
sua maioria, associadas
a investimentos de maior
valor absoluto e
sujeitos a retornos com
prazos mais longos.
O
segundo segmento em
tamanho é constituído
pelos repasses
realizados pelos bancos
comerciais com recursos
do BNDES — operações
indiretas. Nesse caso,
são os intermediários
financeiros que estendem
empréstimos de longo
prazo para seus clientes
para aplicação em alguma
das finalidades
admitidas pelo banco de
desenvolvimento, por
exemplo, a aquisição de
um bem de capital ou a
investimento de expansão
de sua capacidade. Essas
operações indiretas
geralmente se destinam a
investimentos de menor
valor unitário, baixa
complexidade e prazos
relativamente mais
curtos (até 5 anos).
Historicamente, as
operações diretas e
indiretas representaram
cada uma, metade do
saldo dos empréstimos do
BNDES. A partir de 2014,
a participação das
operações indiretas
começou a declinar,
refletindo a queda
acentuada nas vendas de
máquinas e equipamentos.
Entre 2014 e 2016, a
produção de ônibus
acumulada em 12 meses,
por exemplo, caiu de
43.899 para 18.705
unidades e a de
caminhões, de 203.330
para 60.482 unidades
(ANFAVEA, 2016). Em
dezembro de 2016, o
estoque das operações
indiretas havia recuado
para 43% do total dos
empréstimos do BNDES.
O
terceiro segmento do
mercado de crédito
corporativo de longo
prazo reúne as operações
com debêntures. Esses
títulos de dívida são
adquiridos
principalmente pelos
bancos, para serem
mantidos em sua
tesouraria (recursos
próprios) ou para serem
colocadas nos fundos de
investimento que
administram. Finalmente,
o último segmento é o
menor de todos. É
formado pelas
"debêntures de
infraestrutura", que
possuem características
de mercado distintas do
restante. Pelo fato de
gozarem da isenção de imposto
de renda para
o investidor do tipo
pessoa física, são muito
demandadas por famílias
que detêm patrimônio
elevado e que buscam
diversificar o risco e o
retorno de suas
carteiras.
Cada um desses segmentos
obedece a uma
racionalidade própria,
respondendo a vantagens
competitivas
específicas. No
caso dos recursos BNDES,
o custo baixo dos seus
créditos e o apetite de
longo prazo são os
principais atrativos .
No caso dos bancos,
existem vantagens
fiscais, regulatórias,
de liquidez e de
flexibilidade gerencial,
que tornam as operações
de longo prazo através
do mercado de capitais
mais eficientes do que
as intermediadas por
meio de seus balanços.
No caso das pessoas
físicas de alta renda, o
incentivo fiscal lhes
permite competir com os
bancos nos empréstimos
de longo prazo para as
PJ, ao mesmo tempo em
que as empresas acessam
um crédito de menor
custo.
O
BNDES tradicionalmente
desempenhou no sistema
financeiro brasileiro o
papel de principal
financiador de longo
prazo das empresas. Sua
atuação se faz presente
em praticamente todos os
setores. Seus
empréstimos são
vinculados a gastos com
finalidades específicas
(projetos de
investimento, exportação
de manufaturados e
serviços etc.) de acordo
com os objetivos legais
associados a suas fontes
de recursos parafiscais. Em
2016, o banco de
desenvolvimento
respondeu por mais de
50% de todos os
empréstimos bancários
com prazos superiores a
5 anos (Banco Central,
2016).
O
BNDES sempre teve uma
participação elevada no
sistema financeiro
nacional. Entre 2010 e
2016, a instituição
respondeu em média por
20,5% de todos os
empréstimos
bancários. Durante a
crise de 2008, o BNDES
ajudou a sustentar o
financiamento dos
projetos de investimento
em curso, compensando o
encolhimento defensivo
dos bancos comerciais e
do mercado
internacional. Em
consequência, sua
participação no crédito
total aumentou de 15,6%
em meados de 2008 para
20,8% em 2010. O saldo
de suas operações saltou
de 5,3% para 9,4% do
PIB.
Até 2016, o BNDES
continuou atuando de
forma
compensatória, reduzindo
o impacto negativo do
ciclo privado. O Gráfico
2 apresenta as taxas de
crescimento dos
empréstimos corporativos
para os segmentos
direcionado e livre.
Observa-se que, entre
2008 e 2015, a
aceleração das operações
do BNDES — que responde
pela quase totalidade
dessa modalidade — se
contrapôs
sistematicamente à
volatilidade das
operações com recursos
livres.
Gráfico 2. Taxa
de Crescimento do
Crédito Corporativo (%
aa)

Fonte: Banco Central do
Brasil, 2017
Essa atuação foi
possível graças à
manutenção, até 2015,
de programas
anticíclicos do governo
federal. Esses
empréstimos seguiam as
mesmas taxas praticadas
pelo FAT — a TJLP — que
se mantiveram inferiores
às taxas da Selic
durante todo esse
período. O governo, para
sustentar essa política
precisou realizar
empréstimos diretos ao
banco, que montaram a
mais de R$ 400 bilhões
através da emissão de
títulos públicos. Isto
levou a um aumento
exponencial na
participação direta do
Tesouro Nacional na
estrutura de fontes do
BNDES. Passou de um
nível pouco relevante
(7%) em 2007 para a
posição de liderança
desde 2010. Atingiu o
máximo de 58% em 2014 e,
desde então vem recuando
para 49% em setembro de
2017. O Tesouro
respondeu por 70% de
todo o aumento dos
créditos do BNDES no
período. Como essa
captação era feita
através do lançamento de
títulos públicos a
custos de mercado, a
diferença entre as taxas
de captação do governo e
a taxa TJLP praticada
pelo BNDES foi
automaticamente absorvida
pela União.
A
desmontagem dos
programas anticíclicos
financiados com recursos
da União foi iniciada em
2015, motivada. Em
consequência, os níveis
de aprovação e de
desembolso do BNDES
desabaram e não se
recuperaram mais
(Gráfico 3). O resultado
foi uma queda nos
valores das aprovações e
das liberações do BNDES.
Os totais no 3ª
trimestre de 2017
correspondiam,
respectivamente, a 20% e
25% dos montantes
alcançados no último
trimestre de 2014. Como
resultado, o desembolso
total do banco de
desenvolvimento se
limitou a R$ 88,3
bilhões em 2016, pouco
menos da metade dos
quase R$ 188 bilhões
atingidos em 2014.
Gráfico 3: Aprovações
e Desembolsos do BNDES
(Em R$ milhões, Média
trimestral)

Fonte: BNDES (2017)
A
principal alternativa
doméstica ao crédito de
longo prazo do BNDES é
a emissão de debêntures
pelas empresas. Esse
tipo de crédito também
se expandiu rapidamente
a partir de 2004. O
saldo dessas operações
passou de 2,2% do PIB em
2004 para 12,6% em 2016.
Esses percentuais, no
entanto, superestimam a
real dimensão desse
mercado (Gráfico 4).
Gráfico 4. Evolução
do Mercado de Debêntures
* (Em % do PIB)

Fonte: ANBIMA (2017) (*)
Os dados referentes às
debêntures incentivadas
correspondem à soma
acumulada das emissões
em mercado e os de 2017
são referentes até o mês
de outubro
As
empresas de leasing foram
as principais emissoras
nesse período. Desde
2006, elas respondem em
conjunto por cerca de
dois terços do estoque
dessas operações.
Trata-se de
uma característica única
do mercado brasileiro e
decorre do uso massivo
que os bancos fazem
desse instrumento como
um mecanismo de
arbitragem regulatória e
fiscal. As instituições
financeiras estão
impedidas legalmente de
emitir debêntures que,
por isso, gozam, frente
aos instrumentos de
captação bancários, de
vantagens tributárias e
da isenção de depósitos
compulsório junto ao
Banco Central. Com a
emissão de debêntures
pelas empresas de
arrendamento mercantil
pertencentes ao mesmo
conglomerado, os bancos
conseguem driblar esse
impedimento regulatório.
As
debêntures emitidas por
bancos não configuram,
portanto, uma captação
direta de recursos pelas
empresas produtivas
junto ao mercado. O
propósito desse tipo de
operação é gerar para os
bancos comerciais um
título com menores
custos para servirem de
instrumento de captação
junto a seus clientes.
Por esse motivo, esses
dados devem ser
excluídos do
dimensionamento do
crédito corporativo.
Além das leasings, há
um amplo conjunto de
empresas não financeiras
que regularmente lançam
debêntures no mercado.
Entre 2007 e 2016, o
estoque de títulos
dessas emissoras passou
de 2% para 4,2% do PIB,
incluindo-se os papéis
incentivados ou não
(Gráfico 4). Essas
operações, como em todo
o mundo, são
estruturadas e
distribuídas por bancos.
Entretanto, a
particularidade do
mercado brasileiro é
que aqui os maiores
adquirentes desses
papéis são as próprias
instituições
estruturadoras. No
exterior, uma parcela
mais relevante das
colocações é feita junto
a investidores
institucionais
(seguradoras, fundos de
pensão, fundos de
investimento) e pessoas
físicas (Torres e
Macahyba, 2014).
Por esses motivos, a
expansão do mercado de
debêntures corporativas
no Brasil não
deve ser vista, a
exemplo do que ocorre em
outros centros
financeiros
internacionais, como
um efetivo processo de
desintermediação
bancária.
Trata-se, na prática, de
uma maneira mais
eficiente para alargar
os prazos e reduzir os
custos dos empréstimos
bancários, usando as
vantagens proporcionadas
por títulos corporativos
transacionados em
mercados de capitais, em
vez de contratos
bancários.
Somando-se o saldo das
operações do BNDES ao
das debêntures emitidas
pelas empresas ex-leasing chega-se
a uma estimativa do
tamanho e da evolução do
crédito corporativo de
longo prazo em moeda
nacional. O saldo
conjunto dessas
operações era de 7,6% do
PIB em 2003 e se manteve
nessa dimensão até o
início da crise
financeira internacional
de 2008. Desde então,
cresceu até atingir
15,4% em 2015. Nos dois
anos seguintes, houve
forte retração para
12,5%, decorrente do
desempenho do crédito do
BNDES (Gráfico 5). O
BNDES responde por 70%
dos recursos destinados
a essa finalidade, mas
origina apenas 35% do
valor dessas operações.
O restante é feito pelo
sistema bancário.
3. Os desafios do
BNDES: os cinco fatores
contracionistas
Para se pensar
o futuro da atuação do
BNDES é importante ter
presente que no momento
existem cinco fatores
atuando
concomitantemente no
processo de contração do
crédito do BNDES.
O primeiro é de natureza
conjuntural e está
associado à profundidade
do processo recessivo em
curso na economia
brasileira. Houve uma
forte queda da taxa de
investimento — 21,5% do
PIB em 2013 para 15,5%
em 2017 — e uma retração
ainda mais intensa da
produção doméstica de
bens de capital.
Gráfico 5. Evolução
do Mercado de Crédito de
Longo Prazo (Em % do
PIB)

Fonte: ANBIMA e Banco
Central do Brasil. Obs.:
Os dados de 2017
referem-se ao mês
de outubro
Esse determinante não
deve, no entanto, se
sustentar no tempo. A
economia brasileira vem
dando sinais de que, a
partir do segundo
semestre de 2017, entrou
em uma fase de
recuperação lenta. Desse
ponto de vista, é
razoável se supor que a
demanda de crédito de
longo prazo no Brasil
volte a crescer a partir
de 2018 mais rapidamente
que o PIB. Diante desse
cenário, cabe uma
pergunta: será que essa
retomada do crescimento
se traduzirá em uma
maior demanda por
recursos do BNDES? Em
que condições essa
demanda potencial se
materializaria?
A
resposta a essas
indagações requer uma
análise dos outros
quatro fatores
contracionistas que
atuam sobre o crédito do
BNDES:
a)
a perspectiva de se
manter um regime de
taxas de juros e de
inflação historicamente
baixas (um dígito) por
um período prolongado
(três anos pelo menos);
b)
o aumento da taxa de
juros dos empréstimos do
BNDES, com a introdução
da TLP (Taxa de Longo
Prazo) em lugar da TJLP;
c)
a aceleração dos
pagamentos referentes
aos empréstimos
realizados pelo Tesouro
Nacional; e
d)
os efeitos reputacionais
negativos decorrentes da
forte ação de mídia que
associou a imagem do
BNDES a empresas
comprometidas com
delitos de corrupção política
e a efeitos
concentradores de renda
e de riqueza ("meia
entrada").
A
competitividade dos
empréstimos do BNDES
esteve tradicionalmente
apoiada numa combinação
entre taxas de juros
atrativas e prazos
longos. Desse ponto de
vista, a perspectiva de
um período prolongado de
taxas de juros
relativamente baixas e a
criação da TLP muda o
posicionamento de
mercado da instituição
em termos de preço. As
vantagens associadas a
prazos longos foram até
o momento preservadas.
O
BNDES sempre praticou
uma taxa de juros
básica, a TJLP, formada
independentemente do
mercado. Sua evolução
não seguia a taxa de
curto prazo fixada pelo
banco central (taxa
Selic), nem acompanhava
a estrutura a termo da
taxa de juros, baseada
nas taxas cobradas nos
títulos de longo prazo
do governo federal (NTN-B).
De fato, entre 2002 e
2016, TJLP foi sempre
inferior à Selic e
apenas em um curtíssimo
período superou a taxa
da NTN-B de 5 anos
(Gráfico 6).
Ao
longo de 2017, esse
cenário de taxas de
juros nominais muito
elevadas sofreu uma
reversão forte e, até
certo ponto, inesperada.
Ao longo de 2017, a taxa
Selic foi reduzida de
13% para 7% ao ano. A
expectativa dominante no
governo e no mercado
financeiro ao final do
mesmo ano era de que a
inflação e a taxa Selic
serão mantidas em níveis
historicamente baixos
por um período
prolongado. Essa
perspectiva está
presente nas projeções
de longo prazo
divulgadas em outubro de
2017 pelas principais
instituições financeiras
(Tabela1). Esse cenário
mais benigno de inflação
e de taxa de juros se
constitui, por si só, um
fator suficientemente
relevante para obrigar o
BNDES a se ajustar a um
novo padrão de
concorrência de mercado.
Gráfico 6: Evolução
do Custo de um
Empréstimos Indexado à
TJLP, à Selic e à NTN-B
de 5 anos, entre 2002 e
2016 (Em % ao ano)

Fonte: Banco Central
e BNDES
Com a inflação e a taxa
básica de juros mantidas
em níveis baixos, o
diferencial entre a
Selic — que indexa a
captação dos demais
bancos — e a taxa
historicamente praticada
pelo BNDES (TJLP) tende
a se tornar muito
pequeno. De acordo com a
Tabela 1, até 2023
deverão se situar entre
50 e 90 pontos básicos.
Esses valores são
inferiores à margem (spread)
que hoje é cobrada pelo
banco de
desenvolvimento, de
cerca de 140 pontos
básicos (bps), ou seja,
uma margem de 1,4 % ao
ano. O impacto do novo
regime de taxas baixas
de inflação e de juros
sobre o BNDES, mantida a
TJLP, se daria, no
entanto, lentamente.
Pelas projeções, a TJLP
ainda manteria um
diferencial a seu favor,
apesar de muito inferior
ao que apresentou no
passado.
Entretanto, a
substituição da TJLP
pela TLP mudou essa
perspectiva. A TLP será
um espelho da
rentabilidade da NTN-B
de cinco anos. Esse
título público é
indexado à inflação
passada (IPCA) e paga,
acima disso, uma taxa
real de juros, fixada em
leilão pelo mercado. Com
isso, a taxa básica do
BNDES foi reposicionada
para um nível que, ao
longo do tempo, será
superior ao da TJLP e ao
da Selic. Ficará,
portanto, acima do custo
básico de captação dos
bancos (Selic/CDI) e
será maior do que a taxa
cobrada das empresas de
bom risco e que, por
exemplo, conseguem
acessar o segmento das
debêntures incentivadas.
Além disso, a TLP
tenderá a flutuar muito
e a aumentar
substancialmente em
momentos de
crise (comportamento
pro-cíclico).
Tabela 1. Cenário
de Longo Prazo

Fonte: Bradesco. A
projeção da TLP (nova
taxa do BNDES) foi
realizada pelo autor a
partir de dados do
Bradesco e de projeções
próprias
O
FAT também será
comprometido pela TLP
como mecanismo de
captação de recursos de
longo prazo. O ganho
esperado de
rentabilidade do Fundo
ocorrerá em detrimento
de sua perda de função.
Os recursos do FAT serão
competitivos apenas nas
operações com mais de 5
anos. Desse ponto de
vista, parte relevante
do seu fluxo e do seu
estoque tenderão a ficar
ociosos e serão
automaticamente
aplicados em títulos da
dívida pública. Estarão,
portanto, sendo
utilizados, na prática,
para financiarem o
Orçamento da União.
A
alternativa do BNDES
para reduzir seu custo
de captação
seria substituir o FAT
por uma captação direta
em mercado, baseada em
taxas mais competitivas,
como a Selic ou CDI.
Para isso, os mecanismos
de captação disponíveis
precisarão ser revistos
e ampliados, tais como a
emissão de Letras
Financeiras e de
debêntures, por meio da
BNDESPar, sua
subsidiária integral. De
qualquer modo, o fato de
o BNDES não ser um banco
de rede torna
essa tarefa mais difícil
e custosa frente aos
bancos comerciais.
Do ponto de vistas das
empresas, a
introdução da TLP fará
com que o BNDES,
por falta de recursos
adequados, deixe
de cumprir alguns dos
papéis que
tradicionalmente
desempenha há mais de
seis décadas. As
taxas domésticas para
financiamento de
investimentos aumentarão
relativamente pela
maior pressão de demanda
sobre mercado que ainda
são pouco profundos,
como mostramos
anteriormente.
O pleno atendimento
da demanda das empresas
dependerá, portanto, da
existência de mercados
bancários privados e de
dívida corporativa
capazes de absorver a
demanda de fundos para
investimento com
recursos livres. Isso,
no entanto, ainda não se
verifica no Brasil e
requer tempo para ser
desenvolvido. Ao final
de 2016, os bancos
privados detinham apenas
14% dos empréstimos com
mais de 5 anos. O
mercado de debêntures
corporativas, além do
seu porte
limitado, dificilmente
consegue absorver
operações com duração
média superior a esse
prazo.
Além disso, o
BNDES deixará de atuar
como um mecanismo de
proteção dos produtores
nacionais de
máquinas e equipamentos
que praticam elevados
níveis de
nacionalização. Não
poderá também exercer o
papel de "financiador de
última instância" dos
projetos de
investimento, como
ocorreu em 2008 e 2009.
Perderá, assim, a
capacidade de realizar
atuações de fomento e
ações anticíclicas.
Em
paralelo, a política de
aceleração dos
pagamentos dos créditos
do Tesouro Nacional
comprometerá a
liquidez própria da
instituição nos próximos
anos, principalmente em
um cenário de retomada
do investimento. Os
créditos do Tesouro
Nacional foram aplicados
em empréstimos com
prazos médios superiores
a 7 anos, e os
pagamentos
extraordinários não
levam isso em conta.
Assim, a dimensão e a
rapidez no atendimento
às demandas anunciadas
pelo governo poderão
limitar a capacidade de
o Banco atender à
demanda corporativa de
crédito de longo prazo
ao longo do período de
transição, especialmente
se houver dificuldades
para que as fontes
privadas sejam
mobilizadas nos
montantes e nos prazos
adequados.
Para que o mecanismo da
TLP não tivesse esse
impacto tão negativo,
seria necessário que o
mercado financeiro
brasileiro já
apresentasse
características que são
comuns aos países ricos
e que dispõem de moeda
internacionalmente
conversível. Nos EUA, na
Europa e no Japão, por
exemplo, os mercados de
longo prazo são muito
concorrenciais e amplos.
Com isso, as taxas pagas
pela dívida pública são
baixas e relativamente
estáveis. Essas
características permitem
que os bancos públicos
locais possam captar
grandes volumes de
recursos privados,
pagando um spread de
até 25 bps ao ano a mais
do que seu Tesouro
Nacional. Nenhuma dessas
características está
presente na nossa
realidade.
Diante das limitações do
mercado de crédito
doméstico, o mais
provável é que as
empresas e os bancos se
mobilizem para suprir
essas necessidades
adicionais de fundo de
longo prazo com recursos
externos. Com
isso, retornaríamos em
parte à situação
anterior a 2004, com o aumento
da dolarização dos
balanços das empresas e,
consequentemente, da
instabilidade
macroeconômica.
Caso o governo viesse a
oferecer garantia para o
risco cambial estaria se
introduzindo um fator de
risco elevado nas contas
fiscais.
Finalmente, o fator
reputacional, pela sua
dimensão política, é
aquele que é mais
difícil de ser
incorporado a um cenário
prospectivo. Seus
impactos negativos
afetam tanto as
operações ativas —
empréstimos — como as
passivas — captação de
recursos — do BNDES. A
atuação exagerada e
desinformada dos órgãos
de controle pode
simplesmente tornar
inoperantes por muito
tempo determinados
mecanismos operacionais,
até mesmo aqueles que
foram menos afetados
pelos fatores
financeiros, tais como o
apoio à exportação e a
participação do Banco no
mercado acionário (BNDESPar).
Os
impactos negativos do
fator reputacional se
estendem a vários dosstakeholders do
BNDES. O corpo técnico
pode ter sua atuação
limitada medida por
riscos morais e
financeiros que
penalizem sua
participação no processo
decisório da
instituição. Os
financiadores potenciais
do banco de
desenvolvimento, no
Brasil e no exterior,
podem se retrair e, com
isso, aumentar o custo
de captação da
instituição em momento
de transição já bastante
complexo. O problema
reputacional também cria
um ambiente negativo
junto à opinião pública,
inclusive junto aos
empresários e aos
membros do Congresso
Nacional.
A reação ao último fator
negativo dependerá
basicamente do interesse
do Poder Executivo em
manter a instituição
entre seus principais
mecanismos de atuação. O
BNDES, ao longo da
história, mostrou
flexibilidade e
capacidade de responder
às diferentes demandas
de diferentes
governantes, em busca de
mudanças estruturais na
economia. Foi assim nos
anos 1970, com o
programa de investimento
do II PND; com a
inserção internacional
competitiva na década de
1980; com a privatização nos
anos 1990; e com a
expansão do crédito
corporativo e a ação
anticíclica nos 2000. A
interrupção do processo
de desmontagem em curso
e a reorientação do
BNDES em novas bases e
com novos focos
dependerá
necessariamente da
atuação concertada do
governo federal e da
administração do BNDES
por um longo período de
tempo. O resultado de
uma reorientação dessa
natureza será, no
entanto, mais bem
sucedido quanto mais
cedo for iniciada.
4. Sugestões de
Medidas para o BNDES
Como base nesse cenário,
as sugestões que serão
apresentadas têm o
propósito de criar
condições para que o
BNDES — e
consequentemente o
Estado brasileiro —
possa continuar a atuar
no mercado de crédito
corporativo doméstico,
no atendimento corrente
do investimento, no
fortalecimento da
estrutura de capital das
empresas e em ações de
natureza anticíclicas.
Não se pretende com as
iniciativas propostas
evitar as mudanças
estruturais em curso
associadas ao novo
regime de taxas de juros
e de inflação baixas. O
BNDES continuará
precisando ajustar sua
atuação à nova realidade
de crédito do sistema
bancário e do mercado de
capitais: maior volume e
maior duração da oferta
voluntária de crédito
corporativo de longo
prazo.
Essa trajetória será
benéfica para a economia
brasileira sob qualquer
ponto de vista e precisa
ser, inclusive, no
possível, estimulada
pelo BNDES. As medidas
sugeridas possibilitarão
ao banco de
desenvolvimento
condições para promover
um ajuste ordenado a
essa nova realidade,
mediante a criação de
novos produtos
financeiros, a revisão
de seus mecanismos
operacionais, garantindo
que a instituição possa
cumprir seu papel de
financiar o investimento
produtivo e promover o
desenvolvimento
nacional.
Medidas Propostas
a) Liquidação do passivo
do BNDES com o
Tesouro mediante a
transferência para a
União de créditos que
foram originados com os
recursos repassados pelo
governo federal.
Com isso, o BNDES
reduziria de imediato o
tamanho do seu balanço
(ativo e passivo) e de
sua liquidez. Voltaria a
ser uma instituição
exclusivamente voltada a
atividades de
financiamento ao
desenvolvimento que não
teria mais envolvimento
financeiro nem político
com o Orçamento da União
e com o Tesouro
Nacional. A gestão da
carteira que fosse
transferida poderia
continuar sendo feita
pelo BNDES, que
permaneceria como
garantidor perante a
União do risco dessas
operações. Essa
transferência poderia
ser realizada através da
criação de uma empresa
federal de propósito
específico, que
carregaria esses
créditos e débitos. Uma
alternativa seria
utilizar uma empresa
estatal já existe para
isso, no caso a EMGEA —
Empresa Gestora de
Ativos — do governo
federal.
b)
Ajuste no cálculo da TLP de
forma a criar um
mecanismo que reduzisse
ospread que
atualmente cobrado acima
do IPCA.
De
acordo com a legislação
em vigor, a TLP é um
espelho da taxa que
incide sobre os títulos
públicos indexados ao
IPCA pelo prazo de 5
anos, as NTN-B. O ajuste
proposto seria criar por
medida legal um redutor
de fixasse esse spread em
metade da taxa paga pelo
Tesouro nesses mesmos
títulos. Haveria assim
um diferencial favorável
a TLP frente às taxas
cobradas pelo mercado
nas NTN-B de cinco anos.
Com isso, os recursos do
FAT voltariam a ser
competitivos. Ademais,
esse diferencial seria
flexível. A TLP
acompanharia sempre a
NTN-B, mas numa
magnitude menor. Em
situações normais, essa
diferença tenderia a ser
pequena. Porém, em
momentos de estresse
macroeconômico, quando
as taxas de mercado
tendem a subir muito, a
diferença entre a TLP e
a taxa da NTN-B de cinco
anos aumentaria o que
permitiria que os
recursos do FAT
pudessem, nessas
oportunidades, ser
usados como instrumento
de atuação anticíclico.
c) Isenção pelo BNDES do
pagamento de Imposto de
Renda e Contribuições
Sobre o Lucro e
desobrigação de
transferir dividendos à
União.
Esses mecanismos
extra-orçamentários são
utilizados em outros
países, como a Alemanha,
para conferir vantagens
marginais de custo a
seus bancos de
desenvolvimento,
inclusive como meio de
reduzir o impacto de
ineficiências que são
inerentes ao controle
público dessas
instituições.
d)
Criação da Letra de
Crédito de
Infraestrutura ou a
Letra Financeira
Vinculada à
Infraestrutura que seria
emitida com lastro em
operações amparadas na
Lei 12431 e nas
condições estipuladas
por essa Lei.
Com isso, o BNDES teria
condições de concorrer
em igualdade com as
grandes empresas na
captação de recursos de
longo prazo, sempre que
estivesse financiando
diretamente projetos
amparados nessa
legislação. O
financiamento do BNDES
terá sempre uma
importância muito grande
em investimentos na fase
de projeto e nos
projetos que requeiram
prazos mais longos.
6. Conclusões
O
BNDES atravessa o
momento mais difícil de
sua história. A ação em
simultâneo de fatores
políticos e econômicos
obriga a instituição
inevitavelmente a
se reinventar. O rumo
que tomará ainda não
está escrito.
Entretanto, há um risco
elevado de o BNDES ser
desmontado em um prazo
relativamente curto.
A
capacidade de resposta
instituição é limitada.
Sua carteira de ativos e
seu corpo técnico são
elementos que permitem
sustentar um
redirecionamento
positivo. Entretanto,
o aspecto político da
questão será
determinante nesse
processo. Um banco de
desenvolvimento só tem
sentido se o governo que
o comanda vê valor na
sua atuação. Ao longo de
mais de 60 anos de
existência, esse
princípio esteve
presente nos mais
diferentes momentos da
história do Brasil.
Todos os governos até
recentemente, de alguma
maneira, perceberam a
importância de manter o
BNDES como um
instrumento para levar a
frente sua agenda de
transformação no setor
corporativo.
O
fim do BNDES significa
transferir uma parcela
relevante de poder do
Estado para os grandes
bancos nacionais. A
concorrência no
provimento de crédito às
empresas se reduzirá. Ao
mesmo tempo, se
eliminará o principal
mecanismo de
direcionamento de
crédito às empresas, sem
que outros instrumentos,
como, por exemplo, os de
garantias públicas,
sejam alternativas
viáveis.
Não há nenhum país de
porte no mundo que não
disponha de mecanismos
relevantes de
direcionamento do
crédito, o que varia são
os instrumentos de
direcionamento
utilizados
(Torres 2009).
O BNDES se manteve
como um banco de porte
elevado no sistema
financeiro nacional por
causa das deficiências
estruturais do nosso
mercado financeiro.
Durante toda a segunda
metade do século XX, foi
impossível desenvolver
um mercado privado que
oferecesse crédito de
prazos longos, em volume
expressivo e a taxas
razoáveis. Esse cenário,
no entanto, começou a
mudar a partir de 2003
com a modernização da
dívida pública e a
ampliação dos mercados
domésticos de crédito.
Entretanto, as elevadas
taxas de juros que ainda
eram cobradas limitaram
o desenvolvimento mais
rápido do mercado de
crédito de longo prazo.
Com a instalação de um
regime de taxas baixas
de juros, como agora, o
BNDES tende a sofrer
mais intensamente a ação
concorrencial dos bancos
comerciais e do mercado
de capitais. Isso
implica na redução de
seu tamanho — ao menos
em termos relativos — e
na mudança de foco de
sua atuação. Esse
processo, em tempos
normais, iria ocorrer,
de forma lenta, o que
permitiria ajustes
incrementais. Foi isso
que aconteceu com as
instituições de
desenvolvimento de
outros países, inclusive
no primeiro mundo.
O
desenvolvimento do
mercado de crédito
corporativo de longo
prazo já está em curso
lento há mais de uma
década. Esse processo
foi acelerado pela
perspectiva de o mercado
financeiro atravessar,
pela primeira vez, um
período prolongado com
inflação e taxas de
juros baixas. Esse novo
quadro, por si só, já
obrigaria o BNDES a se
ajustar. A dificuldade
dessa transição no
Brasil, é que o aumento
exagerado da taxa de
juros do FAT, com a
criação da TLP; a
aceleração das
amortizações ao Tesouro;
e o problema
reputacional tornam esse
processo de ajuste do
BNDES muito rápido,
problemático e caótico.
Ainda há tempo de um
cenário de desmonte ser
evitado. Existem
decisões importantes que
podem ser tomadas que
tornariam o ajustamento
do BNDES mais lento e
orgânico. Essas medidas
precisariam, no entanto,
ser discutidas, tomadas
e implementadas no
período 2018–2019. Caso
contrário, o processo de
desconstrução do BNDES
ocorrerá de forma rápida
e sem rumo,
comprometendo
desnecessariamente a
instituição e a
capacidade de o Estado
brasileiro poder ter uma
atuação positiva nas
transformações
necessárias à retomada
do desenvolvimento
nacional. |