A solvência do PBB FAPES
 

Adriano Conde Vitor

Arquiteto do BNDES

 
Em janeiro, a FAPES realizou uma enquete em seu Portal para conhecer quais temas os participantes e beneficiários gostariam que fossem abordados em futuros encontros presenciais da Fundação.

Com a participação de 243 pessoas, o tema mais votado foi "Solvência do Plano Básico de Benefícios", seguido por "Governança". O terceiro lugar foi "Prevenção à Saúde e Promoção da Qualidade de Vida" e o quarto foi "Resultado dos Investimentos". "Regras de Utilização do Plano de Assistência e Saúde" e "Empréstimos e Financiamentos" vieram na sequência.

Lembremos que "a FAPES administra um plano da modalidade de benefício definido considerado maduro, ou seja, as receitas previdenciais correntes são inferiores às despesas de pagamentos de benefícios. Nesse caso, se acentua o vínculo entre a gestão dos ativos e os compromissos atuariais, pois a geração de caixa dos investimentos representa parcela importante da cobertura dos pagamentos das despesas previdenciais (grifos nossos)"1.

Nesse contexto, é impressionante que o tema "Resultado dos Investimentos" tenha sido menos votado que "Promoção da Qualidade de Vida", ou seja, aparentemente os 243 votantes pouco atentaram para o fato que a solvência do plano depende muito do resultado dos investimentos. E, nos últimos anos, esse resultado foi, no mínimo, pífio. Em 2015 e 2014 ficou bem aquém do CDI, e no ano de 2013, o resultado geral foi negativo em 2,37% e o resultado das aplicações em renda fixa foi negativo em 9,43%.

No acumulado destes três anos, a FAPES performou 14,8%, as Entidades Fechadas de Previdência Complementar (EFPCs) acumularam em média 16,4%, o Fundo Verde FIC FIM, sob gestão de Luis Stulberger, emplacou 65,33%2 e a inflação acumulada do período, 23,54% (IPCA).

No hotsite do plano de equacionamento da FAPES, a justificativa para as causas do déficit do PBB é a seguinte, ipsis litteris:

"Nos últimos anos, uma séria crise econômica afetou o Brasil, causando prejuízos financeiros e atingindo fortemente diversos setores, inclusive a indústria de fundos de pensão.

Segundo dados da Abrapp (Associação Brasileira das Entidades Fechadas de Previdência Complementar), o déficit acumulado das fundações, em dezembro de 2015, somava R$ 76,7 bilhões, o que corresponde a um aumento de 743% em relação ao déficit apurado em dezembro de 2012, de R$ 9,1 bilhões.

Esses dados comprovam que os resultados deficitários do PBB, administrado pela FAPES, não foram um fato isolado, mas sim parte de um contexto que afetou todo o sistema de previdência privada. Nos três últimos anos, os resultados dos investimentos da instituição não foram suficientes para superar a evolução da Taxa Máxima Atuarial (TMA). Enquanto a rentabilidade média estimada das Entidades Fechadas de Previdência Complementar (EF-PCs) acumulou 16,4% no período 2013-2015, a TMA registrou uma variação de 47,1%.

 

 
 
Diante desses fatos, concluiu-se que o déficit apurado na Avaliação Atuarial de 2015 advém de causa conjuntural."

Tais argumentos parecem ser insuficientes e inconclusivos para explicar o déficit atual, e nada além foi dito a respeito, a não ser: "Dessa maneira, o equacionamento do déficit do PBB será feito por meio de cobrança de contribuições extraordinárias, uma vez que essa é a forma, em geral, adotada em causas conjunturais."

Em meu ponto de vista, são outras as razões para a má performance da Fapes Investimentos nos últimos anos:

1º) A redução do juro real no Brasil, ao longo da última década 3,4, uma vez que mais de 60% da carteira está em renda fixa.

2º) Um resultado inexplicável nos investimentos em renda fixa em 2013, negativo em quase 10%. Talvez não tão inexplicável assim: no início de 2013 houve uma inflexão da taxa Selic5, não prevista pela FAPES, conforme se lê na sua política de investimento daquele ano6:

"Em 2013, as expectativas de juros menores e das medidas de incentivo do governo, como os planos de investimentos em infraestrutura e as desonerações fiscais, devem contribuir para uma aceleração do crescimento. Nesse cenário, as perspectivas são de manutenção da inflação acima do centro da meta pelo quarto ano consecutivo. Para os juros, espera-se que a Selic fique estável até o último trimestre, quando as expectativas inflacionárias para 2014 e a própria dinâmica do crescimento levariam ao início do ciclo de aperto monetário". (pag. 6)

Naquele momento, os títulos pré-fixados existentes iniciaram uma queda acentuada. O NTNB-Principal-2035, que valia em torno de R$950,00 no início de 2013, iniciou 2014 valendo em torno de R$600,00. Todos os títulos pré-fixados e indexados à inflação seguiram o mesmo caminho:

"NTN-B e Riscos dos juros

Se você comprar o título e puder esperar até a data de vencimento, não precisa se preocupar se o governo vai aumentar a taxa de juros (taxa Selic) ou se as taxas irão sofrer variação até o vencimento. Os riscos ou oportunidades ocorrem se você comprar a NTN-B ou NTN-B Principal com planos de vender o título antecipadamente, ou seja, antes do vencimento. Nesta situação existe o risco de você vender o título e obter uma rentabilidade menor do que a que foi prometida. Também é possível que a antecipação aumente a rentabilidade. O que vai determinar isto é se a perspectiva para a taxa de juros é de alta ou de baixa. Quando os juros estão aumentando: O preço atual da NTN-B diminuem; Quando os juros estão diminuindo: O preço atual da NTN-B aumenta. Podemos concluir que é desvantajoso vender o título antecipadamente se as taxas de juros oferecidas para quem vai comprar novos títulos estão subindo, pois isto faz o preço destes títulos caírem7."

A renda fixa representa em torno de 65% do patrimônio da FAPES. Nesse segmento, a exposição a títulos de longo prazo atrelados à inflação é em torno de 80%, e à Selic, 10%8; daí se percebe o impacto da precificação a mercado desses títulos.

Do início de 2013 ao início de 2014, a taxa Selic foi de 7,25 para 10,50%. Como consequência, as NTN-B com vencimentos para 2024, 2035 e 2050, que estavam sendo negociadas às taxas de 3,57%, 4,03% e 4,09%, respectivamente, passaram a ser negociadas a 6,43%, 6,57% e 6,62%9. No período, o fundo Albatroz (CNPJ 05.503.817/0001-04), que detinha a maioria dos recursos do PBB, teve seu patrimônio líquido reduzido de R$ 5,7 bilhões para R$ 5 bilhões10, amargando prejuízo de 11,1%. O Fundo Águia, que, até o primeiro bimestre de 2014, era um Fundo de Investimento em Cotas (FIC) composto por cotas de dois fundos de investimento, Fundo Albatroz e Fundo Bem-Te-Vi, teve prejuízo de 9,43%, pois basicamente espelhou o resultado do Albatroz (uma dúvida que os leitores atentos obviamente terão é: por que um fundo gerido pela FAPES aloca seus recursos em cotas de outro fundo gerido pela FAPES?).

Após o tombo de R$700milhões em 2013, a FAPES realizou algumas alterações em sua política de investimentos. No Anexo IV - ALM (Asset Liability Management) – foi sugerido:

"Outra indicação dessa otimização contemplou a precificação de títulos públicos de longo prazo indexados à inflação pela marcação na curva, ou seja, "títulos mantidos até o vencimento" conforme prevê a legislação vigente."

Em 2014, o relatório de política de investimento introduziu o seguinte texto:

"A partir da alocação estratégica definida no ALM, são realizadas realocações com o objetivo de ajustar a composição do segmento às alterações de curto prazo nas perspectivas de retorno e risco, em consequência de mudanças no cenário macroeconômico ou nos preços de mercado dos ativos."

"A FAPES pode, em função das indicações dos resultados do ALM, registrar ativos na categoria de ‘títulos para negociação’ e na de ‘títulos mantidos até o vencimento’, na forma estabelecida pela legislação. Nesta última categoria, o benchmark é o IPCA acrescido da taxa de desconto atuarial vigente."

Em resposta a um questionamento realizado por mim sob nº 33963620170119070104, a Fundação esclareceu: "No primeiro bimestre de 2014, houve uma reestruturação dos Fundos de Renda Fixa com o objetivo de segregar as classes de ativos em distintos fundos, de forma a deixar mais transparente cada uma das estratégias, bem como facilitar a comparação com seus respectivos benchmarks."

Na ocasião, os fundos Águia e Albatroz foram descontinuados e reabertos com o mesmo nome. Foram retirados R$ 4 bilhões do Albatroz, para realocação conforme a nova política de investimento. Pode-se supor que, neste movimento, a Fundação ‘realizou o prejuízo’ de 2013, com a venda de parte dos títulos no mercado secundário, justamente no pior momento, em que a curva de preço começava a inflexionar pra cima novamente (se serve como alento, aquele citado NTNB-Principal-2035, por exemplo, viria a recuperar o valor que tinha no início de 2013 somente no segundo semestre de 2016).

Em resumo, uma gestão passiva em renda fixa11 e uma exposição elevada a títulos que embutiam um componente pré-fixado (IPCA + taxa pré), ocasionou, num momento de inflexão de taxas de juros, a redução de R$ 700 milhões no patrimônio da PBB.

3º) A mesma gestão passiva também parece ser a regra nos investimentos em renda variável da Fundação, fazendo com que a rentabilidade flutue ao sabor do índice ibovespa, performando, em longo prazo, menos que aplicações em renda fixa 12,13,14 e impactando negativamente o resultado geral da carteira.

Tal comportamento não é exclusivo da FAPES: pela base de dados ANBIMA, "dos 506 fundos de investimentos em atividade, cerca de 73,3% dos fundos após todo o esforço, análise de mercado, e expertise de seus gestores (sic) não conseguirem entregar para seus cotista uma rentabilidade superior" ao CDI15.

Em futuro artigo, pretendo apresentar mais detalhadamente o desempenho, a relação risco/retorno e os custos dos fundos nos quais a Fundação mantém os recursos aplicados.

Na outra ponta da questão, há o custeio do PBB, pois, evidentemente, uma ‘taxa de administração’ maior implica em resultado líquido menor. Para o custeio do Plano, é prevista a destinação de 10% das contribuições vertidas, pagas pelos ativos, assistidos (deduzida do salário e do benefício, respectivamente) e pelo patrocinador16. Adicionalmente, há a transferência de recursos dos investimentos do Plano de Benefícios para o Plano de Gestão Administrativa (PGA). "Atualmente, dos investimentos, o que vem sendo subtraído para custear as despesas administrativas é da ordem de 0,6 a 0,7%", nas palavras do próprio diretor superintendente da FAPES, Henrique Silva17.

Ou seja, a FAPES conta com uma Diretoria Superintendente – DIRSUP, uma Diretoria de Investimentos – DIRIN, um Comitê de Investimentos – COMIN, uma Diretoria de Administração e Controles – DIRAC, um Administrador Estatutário Tecnicamente Qualificado – AETQ, todos empenhados em garantir os melhores retornos e os menores riscos sobre os investimentos, e não entregaram metade da rentabilidade do CDI no período 2013-2015.

Entendo que a ‘taxa de administração’ deva ser compatível com a ‘taxa de performance’, assim como a ‘taxa de risco’ deva ser compatível com a ‘taxa de retorno’, para qualquer investimento ou empreendimento. No caso do custeio do PBB, isto parece estar longe de se comprovar.

Tendo em vista, portanto, a proximidade do novo encontro entre Fundação e participantes, que abordará o tema mais votado da enquete, "Solvência do Plano Básico de Benefícios", julgo ser relevante que sejam abordados os temas dos investimentos e do custeio do PBB, uma vez que o resultado destes é fundamental para a saúde financeira do plano.

__________________

1 https://www.fapes.com.br/investimentos/politica-de-investimentos/ Política de Investimentos 2017 (PDF - pág.4)

2 http://files.verdeasset.com.br/pdf/rel_gestao/158094/Verde-REL-2017_01.pdf

3 http://www.clubedospoupadores.com/investimentos/juros-reais-no-brasil.html

4 http://www.paulogala.com.br/breve-historico-da-taxa-de-juros-real-no-brasil-2/

5 http://arte.folha.uol.com.br/graficos/UuNyB/?

6 https://www.fapes.com.br/investimentos/politica-de-investimentos Política de Investimentos 2017 (PDF - pág.6)

7 http://www.clubedospoupadores.com/tesouro-direto/como-investir-tesouro-ipca.html

8 https://www.fapes.com.br/participante/investimentos/patrimonio/renda-fixa/

9 http://cbfp.com.br/2014/wp-content/uploads/2014/11/5_SP2-Antonio_Gazzoni.pdf

10 http://infofundos.com.br/lamina/fundo/13068

11 http://sl.empiricus.com.br/fixa-rf/

12 http://www.clubedospoupadores.com/investimentos/renda-fixa-x-renda-variavel.html

13 http://www.infomoney.com.br/blogs/investimentos/infomoney-recomenda/post/3992646/grafico-que-vai-fazer-voce-fugir-manter-longe-bovespa

14 https://leitaoemacao.wordpress.com/2008/09/11/ibov-grafico-historico-desde-1963-dolarizado/

15 http://terracoeconomico.com.br/os-fundos-de-investimentos-brasileiros-mais-rentaveis-do-seculo-xxi

16 https://www.fapes.com.br/participante/relacionamento/noticias/andamento-do-processo-sobre-equacionamento-do-deficit.htm

17 https://youtu.be/2wcTifJzZTc

 
 
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